sexta-feira, 19 de outubro de 2018

A CRÍTICA DO VOTO CRÍTICO – PARTE 3


Por Eric Garcia
os posicionamentos deste texto são de responsabilidade do autor
(Ver também Parte 1 e Parte 2)

Chegamos no final deste texto com uma questão ainda aberta. Porque muitos grupos, indivíduos e partidos que se reivindicam revolucionários insistem em apostar em uma via social-democrata como o PT, mesmo que criticamente, para estabelecer um terreno mais favorável à luta pela revolução? Será mesmo que esse apoio crítico é uma reação contra as ideias fascistas ou autoritaristas? Analisemos um pouco mais.

O voto crítico não é contra Bolsonaro
É muito interessante notar como que a figura do Bolsonaro faz tantas pessoas apoiarem o PT no segundo turno, mesmo que “criticamente”, mesmo que com um enorme desgosto. De fato, Bolsonaro representa tudo que há de retrógrado na humanidade, e isso faz essas pessoas apostarem no outro lado da moeda. Mas porque dar apoio ao outro lado da mesma moeda? Mesmo os partidos que acusam o PT de estar vinculado de corpo e alma ao capital apostam suas fichas na sua capacidade de frear a onda conservadora que Bolsonaro representa. Mas será que essas pessoas e grupos políticos estão dando um voto crítico no PT enquanto, de fato, uma última esperança contra o Bolsonaro e sua proposta autoritária de governo?
Voltemos, então, no tempo. Há exatos quatro anos, quando Dilma Rousseff disputava o segundo turno das eleições presidenciais contra Aécio Neves. Não havia, neste contexto, um risco iminente de voltarmos à ditadura, não haviam levantes fascistas, propostas autoritárias de governo e nem candidatos que demonstravam abertamente profunda admiração por figuras que fizeram história como torturadores. Mas mesmo assim, pessoas e organizações defenderam o mesmo argumento do voto crítico. É o caso da Esquerda Marxista, que afirmou que: "A tarefa de classe é derrotar Aécio e depois arrancar, nas ruas, as reivindicações. Ou o PT rompe com a burguesia ou vai pagar caro”, e também do pensador marxista José Paulo Netto, membro do PCB, quando disse que deveríamos votar na Dilma com um dedo no nariz e o outro na urna, apenas para impedir que o Aécio ganhasse.
Não era uma frente antifascista que motivava o voto crítico antes. Da mesma forma, não o é agora. É uma aposta sem sentido em o governo social-democrata “romper com a burguesia” e depois facilitar a luta revolucionária, como afirmaram em 2014. Apostam que um governo de “esquerda” no poder pavimentaria o caminho para a destruição de si mesmo. Uma ilusão total e uma falta de perspectiva radical.
A partir disso podemos nos perguntar, como que lutar sob um governo social-democrata seria melhor, já que, como apontou José Barata, “Os vários anos de hegemonia petista nas lutas sindicais, e mais tarde no governo federal, produziram toda uma geração de trabalhadoras e trabalhadores que são incapazes de conduzir suas próprias lutas”? Logo, a análise que fazemos é que grande parte desse discurso do voto crítico é reflexo desse amansamento que perdurou por mais de uma década em que o PT esteve no governo. Muitos dos militantes de aspiração revolucionária estão se acomodando, conformados com a situação política atual, gastando energias para manter a ordem democrática, esperando que um levante revolucionário consciente e ativo ressurja como uma fênix das cinzas de um movimento operário derrotado, mas que teve um passado glorioso de lutas e enfrentamentos diretos.
Existe ainda uma parcela de indivíduos que pensam a revolução como um horizonte possível, e não necessariamente defendem o voto crítico, demonstram um discurso também conformista quando afirmam que nosso papel é apenas estudar, enxergar as contradições, conhecer nosso inimigo, para nos prepararmos para uma possível revolução que está por vir. Este é o caso bastante comum de um marxismo acadêmico que há muito tempo se desvinculou totalmente de uma política de classes. Indiscutivelmente, responder a pergunta “o que fazer?” é tão difícil como dar a volta ao mundo em 80 dias em cima de um balão. Entretanto, por toda experiência histórica que o movimento operário já passou, podemos ter muito mais firmeza ao responder o que não fazer.
Sei que meio do caminho já é alguma coisa, sei que o menos pior pode ser escolhido no lugar da catástrofe, pois as condições concretas agem de forma brutal na vida de muitas pessoas, na mínima condição da sobrevivência. A questão é: até que ponto a social-democracia é menos pior que a extrema direita? É claro que não é correto afirmar que não exista diferença entre ambos, mas ambos defendem o mesmo capital, apenas de diferentes maneiras.
Apesar de todo esse apelo ao voto crítico, a cada eleição que passa, os votos brancos e nulos, bem como as abstenções, aumentam expressivamente no cenário eleitoral. Claro que isso não significa necessariamente uma revolução iminente, ou mesmo uma elevada consciência de classe, mas demonstra que muitos estão descontentes com as opções dadas. Inclusive, muitos são os relatos daqueles que foram votar, mas não quiseram perder seu tempo nas imensas filas das zonas eleitorais.
Por isso, precisamos relembrar que o espírito revolucionário deve combater de frente essa lógica conformada do “menos pior” ou do “melhor campo de batalha”. Ambos os lados nessa disputa de governo são nossos inimigos. Se não nos atermos a isto, poderemos estar fortalecendo àqueles que sempre lutaram para minar todo e qualquer movimento revolucionário na história. Correremos sempre o risco de, enquanto classe, ficarmos presos à velha consciência cidadã de eleitores, perdendo de vista que existem possibilidades além do horizonte eleitoral. Nossas energias, enquanto militantes, já estão gastas em demasia por vivermos nesse momento tão contrarrevolucionário de acirramento das condições de vida e de luta, por isso devemos nos preocupar com pautas verdadeiramente revolucionárias, que podem nos levar, de fato, a uma sociedade na qual o capital esteja superado!
Precisamos com urgência aprender a nos organizar enquanto movimento autônomo das burocracias do Estado, sindicados e partidos institucionais. Só através dessa auto-organização os trabalhadores podem ter uma chance de se libertar da ditadura do capital que nos atormenta, independente de qual regime político.


Nenhum voto é verdadeiramente crítico!

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